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2013 x 2021: A atual crise hídrica na cidade de São Paulo supera a antiga?

Sistemas mananciais da maior capital do Brasil estão sofrendo mais do que há oito anos

A região metropolitana de São Paulo está sofrendo a pior crise hídrica desde 2013, quando a soma de seis reservatórios mananciais da capital alcançaram 57,3% do total da capacidade. Atualmente, com sete represas (o sistema São Lourenço foi construído em 2014 e começou a funcionar apenas em 2018), os níveis atingiram 43,4% do total. Em 2013, os reservatórios tinham mais de 1 trilhão de litros de água e hoje esse número caiu para 844,6 bilhões de litros.

De acordo com Filipe Pungirum, meteorologista da Climatempo, a crise que estamos vivendo está relacionada aos últimos anos, quando houve chuva abaixo da média nos meses de calor. Os meses de agosto menos chuvosos em São Paulo, de acordo o CGE (Centro de Gerenciamento de Emergências Climáticas), ocorreram em 2007 (0,0mm), 2012 (0,1mm), 2010 (0,6mm), 2004 (1,3mm), 2006 (1,6mm), 1999 (2,1mm) e 2013 (5,7mm).

Entretanto, apesar do calor, em 2021 o mês de agosto registrou chuvas acima da média esperada. De acordo com informações do CGE, foram 34,2 mm de volume, sendo que a expectativa era de 29,4mm, então o resultado foi 16,3% acima do esperado. Além disso, foram 11 dias com chuva, sendo que a média para agosto é de apenas sete dias.

Já para o professor Pedro Cortês do Instituto de Energia e Ambiente da USP (Universidade de São Paulo), a atual crise hídrica na região é mais severa do que a passada. "Ela é pior
do que a de 2013 porque hoje nós temos 20% a menos de água armazenada do que no período anterior", analisou o estudioso em entrevista à CNN Brasil. 

Os dados históricos

Em 2013, um novo sistema manancial foi projetado para reforçar o abastecimento de água, o São Lourenço. A represa começou a ser construída de fato em 2014 e iniciou suas operações em 2018. Porém, devido ao aquecimento global, à falta de chuvas e outros fatores como o desperdício de água pelos setores agrícolas e da população, os níveis de todos os sistemas caíram, conforme mostra os dados a seguir:

O Sistema Cantareira, por exemplo, fechou agosto deste ano com 37,10% da sua capacidade total. Há oito anos, o sistema terminou o mesmo mês com 47,30%, uma diferença de 10,2 pontos percentuais. O Sistema Alto Tietê sofreu uma queda de 14 pontos percentuais (58,60% x 44,60%) e o Rio Grande 22,7 (94,60% x 71,90%).

Na comparação dos sistemas Guarapiranga, Cotia e Rio Claro, as diferenças são ainda mais gritantes: 34,1, 34,6 e 54 pontos percentuais de queda, respectivamente. Como o sistema São Lourenço não existia em 2013, não é possível fazer essa comparação. Atualmente, este conta com 57,30%. .         

(FONTE: SABESP)

O aumento na conta

Recentemente, durante um debate proposto por deputados do PT (Partido dos Trabalhadores) na Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, o ex-diretor-presidente da Agência Nacional de Água (ANA) Vicente Andreu defendeu a tese de que a crise hídrica atual resulta de uma "ação irresponsável" do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).

Segundo o político, o órgão foi incompetente ao ter deixado de acionar as termelétricas mais cedo para tentar reduzir os impactos da falta de chuva nos reservatórios das hidrelétricas.

"O ONS aumentou sistematicamente, mês a mês, mesmo as chuvas não chegando, a operação da geração hidráulica no Brasil, e reduziu, de maneira irresponsável, a geração térmica, provocando artificialmente um esvaziamento dos reservatórios. É um padrão que leva à fabricação artificial de crise no final do período chuvoso, gerando uma explosão de tarifas”, declarou Andreu.

Representante do Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB), Gilberto Cervinski ressaltou que a crise resulta "no aumento da conta de luz do povo".

Devido à crise, a Sabesp repetiu medidas paliativas para tentar conter os problemas, como reduzir a pressão da água no período noturno em algumas regiões da cidade de São Paulo, como no bairro Cidade Tiradentes, extremo leste, e também com reajuste de tarifa.

O reajuste anual na conta de água foi de 7,6% e ocorreu em maio, limitado ao IPCA (Índice de Preços para o Consumidor Amplo). A fatura anterior dos moradores de São Paulo tinha o
valor em 10m3 de R$54,14. Com o reajuste, passou a ser de R$58,00, um aumento de R$3,86 incluindo impostos.

Houve investimento?

A Sabesp afirmou que investiu mais de R$ 3 bilhões em aproximadamente 500 obras para melhorar a infraestrutura dos reservatórios, com reduções de vazões, além de reforçar campanhas para orientar a população sobre o uso consciente da água. De acordo com a companhia, várias reformas estruturais e intervenções urbanas foram feitas para conter desperdício de água, com uma redução de 40% para 33% o volume de perda na rede de saneamento básico.

E como fica a população?

Infelizmente, a previsão para os próximos meses segue sendo de menos chuva e mais seca, e a situação atual do Cantareira é considerada estado de alerta, quando o volume está igual ou maior do que 30% e abaixo de 40%. Para ser considerado normal, o reservatório precisa operar com pelo menos 60% de sua capacidade.

De acordo com dados do Centro de Previsão do Clima do Instituto Internacional de Pesquisa para o Clima e a Sociedade, da Universidade de Columbia, o clima sem chuva e seco deve permanecer até o final do inverno.

Segundo a Sabesp, não existe risco de desabastecimento, mas é necessário usar conscientemente a água. Fica claro que a atual crise hídrica supera a de 2013. Resta esperar o clima melhorar e as chuvas chegarem e, infelizmente, fazer malabarismos com o
salário para conseguir suprir o aumento nos preços da comida, da luz e da água.


Texto - Jornalistas: Fernanda Pereira, Kelly Miyashiro, Natália de Mitri, Luísa Pereira e Viviane Duranti

Área próxima ao reservatório do Rio Jacareí, no Sistema Cantareira (FOTO: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO)